As embaixadas de cabeça feitas por Kerlon, o foca, na vitória da Raposa por 4 a 3 sobre o Galo, semana passada, despertaram a ira do lateral rival Coelho, que deu uma entrada dura no adversário. A confusão subseqüente, com trocas de acusações de ambos os lados, nos coloca outra vez às voltas com uma discussão recorrente no meio futebolístico: afinal, o drible feito com a intenção deliberada de segurar a bola é ou não uma provocação ao adversário?
A parábola de Minas Gerais nos dá muitas lições, mas ainda deixa as conclusões em aberto. A crônica esportiva, em sua imensa maioria, saiu em defesa de Kerlon, com o argumento de que futebol é “espetáculo”, “show”, que isso é o que atrai o torcedor ao estádio e tal talento deve ser preservado. Os atletas não envolvidos diretamente que opinaram sobre o episódio – casos de Luís Alberto, do Fluminense, e Kleber, do Santos – condenaram o foca pelo “desrespeito” e aprovaram, tacitamente, a reação de Coelho.
Logo se arma a polêmica entre os que consideram o futebol uma “arte”, um “espetáculo”, e os que consideram o esporte bretão uma “guerra” (divisão essa inevitavelmente pontuada pelos primeiros). Começam, então, a desfilar argumentos em prol do lado defendido:
- Os “artistas” dizem que o drible é uma forma legítima de reter a bola, e, portanto, de privar o adversário da chance de marcar;
- Os “guerreiros” contra-argumentam dizendo que renunciar ao objetivo do jogo (o gol) tirando a bola de disputa é uma atitude anti-esportiva, uma subversão da regra;
- Os “artistas” dizem que prender a bola é uma forma inteligente de fazer o tempo passar e irritar o adversário, forçando-o a cometer faltas;
- Os “guerreiros” vêem no drible improdutivo, sem objetivo, um desrespeito que merece retaliação.
E assim o debate segue, ad infinitum.
Vejo na discussão um conflito na forma de ver o jogo que é tipicamente brasileiro. Na Espanha, ninguém acha ruim um drible plástico sem objetivo. Já na Argentina ou no Uruguai, por exemplo, um gracejo como o do foca provocaria um início de guerra civil. É uma questão da forma de se analisar o jogo.
No Brasil, predomina a visão de que o futebol é espetáculo, show, circo, carnaval, alegria. Por isso a associação com o drible, o sorriso, a plasticidade.
Isso nos difere fundamentalmente dos hermanos, para os quais o futebol é paixão, garra, entrega. É alegria também, mas não nossa alegria circense, uma alegria dramática, de alívio, de catarse.
Entendendo minimamente a cultura futebolística, não é difícil entender a atitude descompromissada que parece fazer parte da seleção brasileira, nem a paixão com que se atiram à bola os argentinos, por exemplo. É reflexo da visão do mundo da bola.
Entendendo-se o futebol como paixão, a atitude do foca parece bem menos aceitável do que apregoa nossa crônica esportiva. Não é legítimo um atleta, seja ele quem for, tripudiar com a paixão dos milhões que existem por trás de cada camisa.
Um exemplo acabado do que acredito que realmente representa o futebol está no vídeo abaixo, uma maravilhosa propaganda do Atlético de Madri. Assista e tente não ficar arrepiado.
Quem conseguir compreender a dimensão, me entenderá.
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Um comentário:
Esse puto só fez isso porque o Cruzeiro tava ganhando. Quero ver ele fazer essa merda no Morumbi, na Vila, na Arena, onde quer que seja, com o time dele tomando de uns 3.
Aliás, pra ser sincero, quem é Kerlon?
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