quinta-feira, 26 de abril de 2007

Deixem os moços com seu dinheiro farto

“Os voluntariosos serão muito bem recompensados,
porque dinheiro é bom e eles gostam” – Ezequiel, I: 9-10

Direto ao vespeiro, que vira e mexe visito em conversas com amigos: defendo que jogadores de futebol tenham altos salários. Melhor, defendo que os poucos jogadores brasileiros que ganham mais de 20 salários mínimos ganhem o que ganham. Acho muito é justo. E acho mesmo que muitos mais jogadores deveriam ganhar muito bem. Se forem do Coringão, melhor ainda.

A noção vigente que diz ser “um absurdo esses caras ganharem salários tão altos, gente que não estudou, que joga bola, portanto se diverte e não trabalha” é na verdade um preconceito sem tamanho. E é assombroso ver como pessoas de todos os matizes sociais, intelectuais e econômicos repetem esse ramerrão. Isso precisa acabar.

Ressalto, acho que nenhum vivente nesta galáxia deveria ganhar salários de R$ 200, 300, 600 mil mensais. Se o Super-Homem existisse e salvasse a Terra todo dia faria jus a uns R$ 20 mil mensais, que é um salário correto a se pagar a um executivo competente e já é uma fortuna para quem usa cueca vermelha por cima da calça. Não acho que um jogador deva ganhar seis dígitos em dinheiro, mas se o capitalismo de hoje assim remunera tipos que fazem infinitamente menos pelo povo do que os boleiros, então que estes forrem os bolsos.

Em primeiro lugar, porque a categoria dos futebolistas não difere muito de nenhuma outra no que tange à percepção de rendimentos. É assim com médicos, advogados, jornalistas – há a maioria que ganha o justo e até menos, e uma elite que ganha muito e fica rica. O preconceito, entretanto, lança todos os jogadores à vala dos ricos fanfarrões.

Não tive como apurar os números atuais, mas não deve ter mudado muito: segundo a CBF, dos 14.678 jogadores profissionais registrados em 2004, 8.930 ganhavam até 1 salário-mínimo, 3.338 ganhavam entre 1 e 2 s.m., 4.311 entre 2 e 5 s.m., 414 entre 5 e 10 s.m., 393 de 10 a 20 s.m. e 631 acima de 20 s.m. Mais de 60% dos jogadores ganhavam até 1 salário-mínimo. Claro está que esses 631 estão nos 20 times da série A. Dentre eles, deve haver aí menos que 100 que ganham mais que R$ 100 mil mensais – aqueles que as pessoas conhecem da TV e que por eles julgam os demais 14 mil que mal têm o da condução para o treino.

Boa parte desses caras que se divertem se trabalhar treina duro seis dias por semana, fica longe da família em concentrações espartanas, não come o que quer, não faz sexo quando quer e sofre pressões que nem presidente de multinacional sofre. Garotos que mal sentaram num banco escolar recebem o peso de julgamento de estádios inteiros, palpiteiros de toda a sorte, torcedores Brasil adentro e afora, coisa que Harvard nenhuma ensina a agüentar. Astros da música lotam estádios em shows pirotécnicos, muito bem roteirizados e que não têm como dar errado; se der, o público ainda aplaude. Jogadores sobem do vestiário para o gramado só com seu talento e sorte, sem saber se voltarão iguais, ou com todo o concreto da derrota em suas costas ou mesmo com o tenebroso abraço da fama e da idolatria, também difíceis de lidar.

Deixem esses moços com seu dinheiro farto, porque em muitos casos são eles que ainda distribuem renda, dando a familiares e amigos aquilo que gerações inteiras de seus ancestrais nunca conseguiram dar. E vão reclamar ao Berlusconi, ao Eurico Miranda, ao Berezovski, ao bispo, a quem inventou esse mercado.

Que eles ganhem muito e muito e nos dêem a magia redentora na vitória. Ou nos mostrem a dureza da vida na derrota.

E perguntem ao Palestrino se ele acha que os caras que ele citou aí embaixo deveriam viver com menos de 20 salários.

Cróifi!, eu sou Cróifi!

Durante a Copa de 74, depois da desclassificação do Brasil (acho que antes também), todos os meninos queriam (diziam) ser Cruyff pelos campinhos. Cróifi!, eu sou Cróifi!, ouvia-se. Para mim, aquele craque era o melhor jogador da melhor seleção da Copa e que ainda usava uma vistosa camiseta laranja, minha cor preferida então. Claro eu também queria ser Cruyff. Parabéns ao artista por seus 60 anos.

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