quinta-feira, 19 de abril de 2007

A grama do vizinho sempre é mais verde

“Há que se endurecer. E ternura é coisa de moça.” – Ezequiel, I: 9-10

“Tu sabe onde tá o Felipe, que jogava no Flamengo?”

Quase todos os domingos à tarde, almoção na casa dos coroas, ouço essa mesma pergunta do meu pai, carregada do seu sotaque carioca. Só muda o nome do jogador.

Com 77 anos, rubro-negro há uns 70, ele padece da dúvida que assombra milhões de torcedores como nós. E, claro, como a maioria de nós, não dá conta de acompanhar a dança dos jogadores entre um time e outro, entre um Brasil e uma Europa.

Engraçada essa mercadoria, os jogadores de futebol. Quanto mais cara, menos encalha, não pára no estoque. Somem diante dos nossos olhos depois de uma entrevista no fim de uma partida.

Como não dá pra segurar os caras mesmo – até o voluntarioso Ezequiel foi pra Ponte depois dos anos de apostolado no Timão – prefiro lançar uma outra dúvida sobre o vai-e-vem de jogadores, dúvida que também atazana o juízo dos corintianos: por que uns jogadores saem do seu time como uma bosta e vão ser craques no time dos outros? Pior, saem craques do time dos outros e chegam umas bostas pra jogar (ou não) no nosso? Pensar nisso é um esporte dentro do próprio esporte.

A lista é grande e todos, aqui e em Barúna, têm exemplos dessa tragédia do futebol. Fico em alguns poucos casos que não me saem da cabeça.

Lembro-me do distante 1993, quando ouvi pela primeira vez o nome de Rivaldo. Pelo Mogi-Mirim (SP) cometera o desplante de marcar o gol que Pelé não marcara, aquele chutão lá do meio campo que pega o goleiro adiantado. Pelé não fez, Rivaldo fez, disseram à época. Pois ele veio para o Corinthians, onde foi um excelente observador de jogadas. Fazê-las que é bom, nada. Foi para o Porco, foi campeão brasileiro em cima da gente (94), foi para o Barcelona, virou melhor jogador do mundo e campeão mundial em 2002 pelo Brasil. Sempre brilhante. No Coringão teve o brilho deste ponto final aqui.

Neste São Paulo, Leandro, Jorge Vagner e Hugo miseravelmente fazem a festa do Morumbi já tão festivo. No Timão, não mereceram que se abrisse nem uma tubaína, que dirá erguer um copo de chope. E, para ficar no Tricolor, a patologia das patologias: Amoroso sai de lá um goleador, faz uma visita ao Milan e chega no Corinthians para uma das passagens mais obscuras da história esportiva moderna.

No Flamengo do meu pai, consolo pra ele, o volante Renato, ex-Timão, é ídolo.

Para todos os casos, pode-se dizer, há razões técnicas. A principal é que jogar no Corinthians é militar mais do que jogar; é lutar por uma causa, mais do que lutar por um título. O sujeito sente.

Bem, rabugices de torcedor, porque o oposto também é verdadeiro. Vejam o Carlitos Tevez e o próprio Edílson. E não temos do que reclamar de um time que já teve o Doutor, o Bigode e por aí vai.

Mas tem a sina.

Envolto pela magia dos campinhos da meninice, Pelé brincava ser jogador do Corinthians. No filme dele, seu irmão afirma que ele era corintiano quando garoto. Deixou de sê-lo e deu no que deu.

-- # --

De tanto o Palestrino falar em técnicos retranqueiros, acabo meio contaminado. Ontem, contra o Náutico, o Coringão, mesmo com três volantes, meteu confortáveis 2x0, recuou e tomou o empate. Tomar gol de um cara chamado Sidny (diz-se Sidní) é duro.


3 comentários:

Don disse...

Profeta sempre poeta!

Mas para não perder a oportunidade, não diria que a grama do vizinho é mais verde. Somente a do Timão (será???) é que anda menos regada.

Anônimo disse...

O Rivaldo jogou bem no Corinthians, sim. Na época lembro até que a diretoria foi criticada, e muito, por deixá-lo escapar.

Caiçara disse...

Pelé ter sido corintiano, em algum tempo, é parte da mitologia popular.

Em Minas, de onde veio para Bauru, muito mais forte era a influência carioca. Dizem que era vascaíno.

Como Rivelino era palmeirense, e Sócrates, santista. No fim, não é a cor do coração que conta, mas a camisa que veste o astro.